domingo, 29 de agosto de 2010

O Nome, A chave do Poder Mágico

 

O conhecimento do nome é o verdadeiro conhecimento: pronunciar o nome é modelar uma imagem espiritual, revelar a essência de um ser. Ao nomear, cria-se. Conhecendo os verdadeiros nomes, ocultos ao profano, vive-se uma mestria. O mais grave para um ser é ver o seu nome destruído. Por isso a magia toma todas as precauções para que o nome dure eternamente. Os elementos do nome, as letras que o compõem, são sons portadores de energia. Quando o mago fala ritualmente, utiliza esses sons como uma matéria  animada, age sobre o mundo exterior, modifica-o se tanto for necessário.

Cada Ser — incluindo as Divindades — possui um nome secreto. O Deus Solar, Rê, não escapa à regra. O pai e a mãe tinham-lhe dado o seu verdadeiro nome, ocultado logo ao nascimento.

 Alguns nomes secretos são revelados pelos textos no decurso de episódios curiosos. Assim, Hórus navegava numa barca de ouro, em companhia do irmão, quando este foi mordido por uma serpente. Ao chamar Hórus em seu socorro, o Deus disse: “Revela-me o teu nome”. Só depois de preencher essa condição é que Hórus médico fez vir o grande Deus para iniciar o processo de cura. Nessas circunstâncias, o irmão foi obrigado a aceder. Confessou: “Eu sou ontem, hoje e amanhã”, “sou um homem de um milhão de côvados, cuja natureza é desconhecida”, sou um gigante”... Hórus escuta aquela litania, mas continua cético. O
verdadeiro nome não figura entre os pronunciados. O outro inclina-se e, finalmente sincero, dá o seu nome secreto: “O dia em que uma mulher grávida pôs um filho no mundo”. Hórus pronuncia então a fórmula da cura. Neste relato, devemos ver sem dúvida uma ilustração simbólica do andrógino, desse ser homem-mulher que existiu na aurora dos tempos, antes da separação do espírito em “homem” e “mulher”.


Cada ser humano tem como missão procurar saber o nome secreto que lhe foi confiado ao nascimento, e do qual se deve tornar digno. Passar vitoriosamente na prova da morte é tornar esse nome duradouro como o de Osíris. A importância do nome é tal que é levado em conta pelos tribunais como valor sagrado. Assim, mudase o nome de criminosos culpados de terem violado um lugar santo ou de terem tentado construir uma moradia mais alta que a dos Deuses. Primeiro grau do castigo: excluir do nome do acusado o do Deus que poderia ser mencionado nele. Na conspiração fomentada contra o faraó Ramsés III, os criminosos haviam utilizado a Mágia para assassinar o monarca. Julgados, mudaram-lhes os nomes, tornando-os odiosos; cada um passou a ser chamado “Rê-o-odeia”, “Mau-em-Tebas”, “o maligno”.

 Esses nomes que apavoram são castigos em si mesmos. Pode-se ir mais longe e suprimir toda a lembrança do culpado fazendo-o desaparecer, ao passo que o nome é um elemento essencial para a sobrevivência. O morto sem nome é condenado à segunda morte. É destruído no seu ser profundo.

                                                                                                                    
No Reino dos Mortos, é preciso antes de mais nada recordar o próprio nome.
O mago apresenta-se como um construtor que merece um lugar proeminente no céu. O nome dele foi pronunciado nos templos. Recordou-se durante a noite de contar os anos e os meses, quando fez a sua iniciação nos mistérios em que os seus pares o identificaram como um adepto. Aos deuses, ele afirma com precisão que o seu nome é um Deus que lhe reside no corpo. Aos seres da luz que encontra no céu, ele declara: “Conheço os vossos nomes”.

Mas o “verdadeiro nome” dos Deuses nunca é pronunciado diante de profanos. Por vezes finge-se revelar o nome recitando uma série de sons incompreensíveis que não têm qualquer significado. Os iniciados da Casa de Vida desencorajavam desse modo os curiosos cujo objetivo era adquirir poderes pessoais e não o de decifrar o sentido profundo dos hieróglifos. Com efeito, cada nome  Divino é formado com letras-mães que fornecem o significado esotérico de cada Personalidade Divina. Tomemos um exemplo. O nome do deus chacal Anúbis é formado por um i, um n e um p, o que dá inp, de onde — com a introdução de vogais para poder pronunciar — Anúbis (a por i, que é uma semiconsoante em egípcio, b alternando com p). Ora, o Papiro Jumilhac explica claramente que cada uma das letras que formam o nome de Anúbis tem um significado preciso. Por elas, o Deus tem poder sobre o sopro vital, a energia e a matéria, três qualificações indispensáveis para preencher o seu papel de embalsamador, de iniciador e de
mestre-de-cerimônias nos ritos de ressurreição.
                                                                                                     
Conhecer os nomes secretos dá acesso aos campos celestes, cujas portas são abertas por Rê e por Nut. Em cada porta do Além, o mago deve provar que conhece o nome do guarda e da própria porta. É necessário fornecer pormenores. Guardião da passagem, Anúbis pergunta a quem deseja entrar: "Conheces o nome do dintel e do umbral?" E necessário responder-lhe: "Mestre de retidão que está sobre as suas duas pernas" (nome do dintel) e "Mestre de força que introduz o rebanho" (nome do umbral). Tal como em todas as confrarias iniciáticas, o viajante é testado. Se os conhecimentos dele são suficientes, é-lhe dito: "Passa, uma vez que sabes!". É preciso ainda escapar dos pescadores que apanham nas redes as almas dos
mortos. Para fazer isso, o mago mostra que conhece o nome oculto de cada uma das
partes da rede, e portanto nada terá a recear.


Nascida no solo do Egito, a Religião Cristã não esquece a Magia do nome. O mago copta identifica-se com Cristo, com Maria, manda nos Deuses, nos espíritos e nos anjos, ameaça o diabo, reza, evocando os "verdadeiros nomes" graças aos quais
espera obter a plena eficácia.




                                                                        

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